"Eu era obrigado a reconhecer minha impotência por causa do total controle que a nicotina tinha sobre mim". Ou: "Não posso ignorar as inúmeras vezes que falhei ao tentar parar, portanto eu devo ser impotente perante a nicotina". Ou ainda: "Só a idéia de parar fazia eu me encolher como uma aranha num forno quente, e então eu soube que isto era maior que eu". Para outros, a consciência desta idéia veio mais tarde - "naquele exato dia, após umas seis semanas de abstinência, em que eu seria capaz de matar por um cigarro". Para outros ainda havia uma espécie de meio termo: "Eu acho que sabia que era impotente, mas não me conscientizei disto até o dia em que fiquei terrivelmente doente e, ainda assim, não consegui parar".
Independente de quando e de como viemos a aceitar nossa impotência, neste momento tivemos que nos confrontar com a idéia de um Poder Superior - o "poder maior do que nós". Para alguns, particularmente para aqueles que tinham uma firme crença ou prática religiosa, ou que tinham experiência em algum outro Programa de Doze Passos, a idéia não era difícil, ou pelo menos o conceito de um Poder Superior não era algo totalmente estranho.
Entretanto para outros a confrontação inicial com a idéia de um Poder Superior era apenas isto - uma confrontação. "Poder Superior? Vocês devem estar brincando!"; "Não me venham com suas tralhas religiosas: eu estou aqui para parar de fumar". Um dos milagres da programação é que o mesmo cético que de início pensou que esta idéia devia ser uma piada, agora diz: "Eu me ajoelho na maioria das manhãs orando ao meu Poder Superior". Outros céticos iniciais escrevem assim sobre seus pensamentos posteriores: "Paz de espírito e minha própria sanidade dependem de eu ser capaz de me render ao meu Poder Superior". "Meu Poder Superior é ‘aquilo’ que faz com que o desejo de nicotina desapareça, e que me protege de ter de ceder diante deste desejo".
Para a maioria de nós, antes que pudéssemos admitir nossa impotência perante a nicotina, ou mesmo reconhecer o possível papel que um Poder Superior poderia ter em resgatar-nos de nossa insanidade, tivemos que "chegar ao fundo". Vários termos e expressões podem exprimir a idéia de "chegar ao fundo": Chegar ao ponto do desespero total; ou: ‘Parar de fumar ou morrer’. Ser despertado pelo "brutal estado emocional em que me encontrava". Ficar aturdido ao ponto de ousar "fazer qualquer coisa" para não usar nicotina. Estar tão desesperados, tão por baixo, tão perdidos, tão doentes, que nos agarramos com nossas mentes e tripas à idéia de que nada era mais importante do que não usarmos aquela próxima dose de nicotina. Ser capaz de viver o lema: "Não fume mesmo que seu traseiro caia!" Chegar ao fundo: definitivamente não é um lugar legal para se ficar! Para alguns de nós no entanto, é um lugar realmente baixo ao qual precisamos chegar antes que possamos considerar a idéia de "voltar para cima" e de Recuperação.
Conforme freqüentamos mais reuniões, descobrimos que nossos atitudes gradualmente mudaram. Apesar de sentir que certamente nunca nos livraríamos da adicção à nicotina, não estamos usando a droga. Aprendemos a entregar nossa vontade e nossas vidas a um poder maior do que nós mesmos. Aprendemos humildade e compaixão. Ganhamos mais auto-confiança e pela primeira vez começamos a entender o quanto é séria a adicção à nicotina - o quanto ela nos afeta espiritual e fisicamente. Experimentamos coragem e esperança. Encontramos lições de fé e tolerância nas reuniões e na vida diária. Sentimos que tínhamos que ser honestos tanto conosco quanto com os outros, para permanecermos livres da nicotina com sucesso.
A Oração da Serenidade nos lembra que não podemos modificar as vontades e os desejos de nicotina. Num sentido mais amplo, aprendemos a usar os conceitos da oração como ferramentas para lidar com as muitas coisas da vida diária sobre as quais não temos poder. Ao mesmo tempo, aprendemos que aquilo que podemos modificar somos nós mesmos, nossas atitudes, nossos pensamentos, o modo como agimos e reagimos, e que isto se aplica tanto à nossa adicção à nicotina quanto à vida em geral.
Um Poder Superior nos guia rumo a escolhas saudáveis se nos mantivermos abertos para ser guiados. Para muitos, particularmente no primeiro ano de recuperação, a principal preocupação é evitar a nicotina. No entanto, mais cedo ou mais tarde, a compulsão desaparece, e então os interesses podem convergir para desenvolver um programa espiritual perene.